segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Escrever


Realidade Visceral


"Rafael Barrios, café Quito, rua Bucareli, México, DF, maio de 1977. Que fizemos os real-visceralistas quando Ulises Lima e Arturo Belano se foram: escrita automática, cadáveres requintados, performances de uma só pessoa sem espectadores, contraintes, escrita a duas mãos, a três mãos, escrita masturbatória (com a direita escrevemos, com a esquerda nos masturbamos, ou ao contrário, no caso de quem é canhoto), madrigais, poemas-romances, sonetos cuja última palavra é sempre a mesma, mensagens de apenas três palavras escritas nas paredes (“Não aguento mais”, “Laura, te amo” etc.), diários desmedidos, mail-poetry, projective verse, poesia convencional, antipoesia, poesia concreta brasileira (escrita em português de dicionário), poemas policiais em prosa (com extrema economia se conta uma história policial, a última frase a esclarece ou não), parábolas, fábulas, teatro do absurdo, pop art, haicais, epigramas (na realidade, imitações ou variações de Catulo, quase todas de Moctezuma Rodríguez), poesia desesperada (baladas do Oeste), poesia georgiana, poesia da experiência, poesia beat, apócrifos de bpNichol, de John Giorno, de John Cage (A Year from Monday), de Ted Berrigan, do irmão de Antoninus, de Armand Schwerner (The Tablets), poesia letrista, caligramas, poesia elétrica (Bulteau, Messagier), poesia sanguinária (três mortos no mínimo), poesia pornográfica (variantes heterossexual, homossexual e bissexual, independentemente da inclinação particular do poeta), poemas apócrifos dos nadaístas colombianos, horazerianos do Peru, catalépticos do Uruguai, tzantzicos do Equador, canibais brasileiros, teatro no proletário... Até publicamos uma revista... Nos mexemos... Nos mexemos... Fizemos tudo que pudemos... Mas nada ficou bom.
"


Os Detetives Selvagens (1998), Roberto Bolaño. Foto Mark Carter